Fernando Lindote é um dos raros artistas que sem repetir-se
jamais, transita com desenvoltura e de forma muito marcante, pelas principais vertentes da arte contemporânea.
A experimentação plástica, aliada a uma inesgotável
capacidade criadora, levou-o a recorrer em diferentes fases, aos mais diversos materiais, procedimentos e suportes.
Em sua individual que esta acontecendo na galeria Sítio,
através de impactante série de óleos sobre tela, articula contundente libelo plástico contra todas as formas de opressão, violência e brutalidade que emanam do centro de um sistema injusto, desumano e cruel.
A exposição organiza-se em torno de dois núcleos:
num deles, colocado logo a entrada, imagens metafóricas de símbolos do poder erguem suas torres fantasmagóricas em meio a vermelhidão de um campo de guerra minado, atravessado por tanques blindados.
Outra tela de igual dimensão, toda em branco e preto, apresenta as mesmas imagens sinistras da praça dos Três Poderes com seus ícones inconfundíveis, corroídos, transformados em carcaças e escombros. Essas estruturas apocalípticas que desabam sobre si mesmas recortam-se contra um fundo negro, que reproduz em relevos da tinta empastada silhuetas do Pão de Açúcar e da Baia de Guanabara, numa busca patética de luz.
O outro núcleo da mostra, organiza-se em torno da grande
tela que representa a figura inquietante de um suíno multicolor de pé, posando à maneira dos retratos oficiais dos grandes mandatários. Na parede ao lado, perfilam-se em pequenas telas irônicos “auto-retratos com máscara
de porco”.
Na ambivalência representativa dos símbolos e metáforas
que utiliza, Lindote sabe evitar o tom discursivo, permitindo sempre que os elementos formais sejam os protagonistas da obra.
Valendo-se dos recursos expressivos tradicionais da técnica
da pintura a óleo, transforma, a partir da aplicação de texturas, cores e veladuras, a superfície das telas em campos magnéticos, em torno dos quais gravitam outros signos.
Tensões espaciais reveladas em todo seu poder sugestivo,
planos e cores simplificados ao extremo, estruturam-se visceralmente, estabelecendo o drama plástico que desvela toda a extensão da tragédia contemporânea.
Colocando-se não como ator da cena, mas sim como testemunha
perplexa de um mundo dilacerado, o artista mantém metafórica distância em relação ao tema, que lhe permite delimitar pela própria estrutura formal, a significação dos símbolos adotados, de maneira que persista a
autonomia plástica e coexistam significados emocionais diversos ou mesmo contraditórios.
A pintura que encerra a exposição é uma surpreendente
e magistral natureza morta. Buscando na melhor tradição do gênero os símbolos da efemeridade da vida, da ressurreição e da morte, o artista criou um conjunto de trágica e deslumbrante beleza.
Sob a iluminação barroca de um céu tormentoso, onde
apenas uma nesga de azul aparece, um crânio invertido serve de pedestal para uma borboleta furta-cor.
No canto direito da tela, envolta em luminosas e transparentes
veladuras, num grito de luz e de esperança, uma flor esplêndida desabrocha. Formula plasticamente premissas básicas para a construção de um novo homem e do advento de uma nova humanidade...
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