quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

A Superfície - Última Crítica escrita por Janga, inédita, sobre a obra magistral de Ricardo Hoffmann.




Janga recebe Ricardo Hoffmann na Casa Açoriana, e conversa apaixonadamente sobre Superfície.

Lançado em 1967 pela Editora GRD RJ  e reeditado em 1978 pela Edições Antares RJ, o livro “A SUPERFÍCIE”  de Ricardo L. Hoffmann já completou meio século desde sua primeira edição. Marco da literatura catarinense e nacional, está a merecer uma reedição urgente  que permita aos leitores da nova geração, conhecerem uma das melhores incursões da literatura nacional na restrita área da ficção intimista   e subjetiva,  voltada mais para a reflexão sobre questões existenciais básicas de caráter universal, que para ações exteriores menos relevantes.
O  tema do livro são as transformações por que passa a mente do jovem de ascendência alemã Heinz,  à medida em que vai entrando em contato com outras possibilidades vivenciais diversas daquelas ditadas pela mente rígida, pragmática e prosaica do pai autoritário e castrador,  que como o pai de “Cartas ao meu Pai” de Kafka, assombra e paralisa o núcleo familiar de Heinz, constituído de uma mãe submissa, uma irmã amedrontada e dois irmãos infelizes e frios como todos os outros. O clima pesado,  cheio de culpa, sem afetividade nem alegria utilizado  pelo autor para descrever o ambiente familiar de Heinz, faz lembrar a atmosfera sinistra do filme “Fita branca”  e o desespero existencial das obras de Lars Von Trier.   Trata-se de um mundo sem perspectiva nem esperança, pautado pela mediocridade expressa nas inexistências pasmosas  de cada um dos infelizes personagens.
Buscando preparar-se para  um concurso da marinha sugerido pelo pai, para o qual Heinz não tinha a menor aptidão, o jovem procura Beto,  quase da mesma idade, e começa a ter aulas de geografia e matérias congêneres. Os pais de Beto eram artistas diletantes,  que pintam por pintar  aproveitando as horas vagas que sobram após o exercício de seu trabalho principal. Beto da mesma forma  pintava  de vez em quando, mais como passatempo que como compromisso  existencial. Heinz  ao saber que seu amigo pintava, convida-o para  conhecer as pinturas  (cópias de folhinhas) que fazia escondido do pai.  A partir dai, cria-se o único laço de amizade deste ser solitário e sem jeito de lidar com as circunstâncias do dia a dia.
No transcorrer da narrativa, Hoffmann vai construindo, com tintas fortes e carregadas, um grande painel expressionista acentuando contrastes exacerbados de luz e sombra, distorções, detalhes  e alusões  metafóricas a “superfície de horrores que se chama vida por onde correm, sempre presentes por baixo da superfície aparente das coisas, o medo,  a aniquilação e a morte”. Essas imagens sucedem-se num ritmo cada vez mais dinâmico definindo a  atmosfera sombria e perturbadora do livro.  Diálogos magistralmente construídos   onde o autor desenvolve seus pensamentos e reflexões sobre morte-vida, arte como proposta existencial de libertação e plenitude versus o mundinho familiar pequeno  burguês com sua mesquinha escala de valores, intercalam-se de forma  vigorosa e  expressiva,  induzindo o leitor a vivenciar  uma profunda  imersão na obra, lendo-a sem parar até chegar ao trágico final. Final esse já pressentido por Beto, o narrador, que percebe  através da observação aflita das pinturas que Heinz começou a criar após sua volta do Rio de Janeiro, o quanto seu amigo estava afastando-se cada vez mais da realidade que o cercava, entregando-se   a mais absoluta solidão e torturada subjetividade.
Esse processo  que o autor esmiúça no segundo capítulo intitulado “O desenvolvimento mórbido”,  já estava latente desde a infância de Heinz mas eclode de maneira mais radical após seu retorno do Rio de Janeiro onde ficou por dois anos servindo o exército e frequentando cursos na escola de Belas Artes. Heinz volta a sua cidadezinha  totalmente desencantado com o que descobriu, confessa a Beto que “tinha conhecido a vida”.
A primeira atitude que toma ao retornar é abandonar abruptamente o  lar materno e ir morar num pardieiro onde instala seu atelier improvisado  em meio a ruinas e escombros,“buscando fora de si, do espírito fecundado pela vida da família até o limite do possível o resto, aquilo que a casa dos  país  não pode dar, porque não é mais o alimento, mas a realização individual que vem depois do alimento precedendo a morte”.
Nas visitas de Beto ao estúdio miserável  de Heinz,  os dois conversam sobre o processo da criação artística aprofundando o tema, definindo segundo uma concepção romântica o que seria a arte,  o artista e o processo criador. Num destes diálogos afirma Heinz: ”Uma tela é uma superfície. Debato-me na superfície dos horrores que se chama vida e deixo que meus gestos sejam reflexos espontâneos das impressões que ela me causa é só isso.” Mais adiante complementa:  “Tudo é uma questão de medida, de intensidade. E uma vez que se descubra a validade do princípio não sei porque não levá-la ao extremo bruscamente, fazendo o tempo contrair-se e dando um salto (quando somos atraídos a isso) diretamente dentro do objeto.”
As relações entre vida e morte, luz e  sombra,  arte e vida  permeiam  todas as páginas  do romance.
  A família de Heinz fechada e  incomunicável, vivia sob a opressão do velho  Holtz,  patriarca implacável que a respeito da arte vociferava : “-O perigo está em que adolescentes sonham viver destas coisas (da arte), porque ai tem o clima de ociosidade e liberdade  enquanto  são filhos de família e vivem às custas do pai. É perigoso pensar que isso pode durar a vida toda.’’
Heinz ao voltar  a sua cidade  e decidir viver plenamente sua liberdade representada pela criação da sua arte, afirma para Beto que: “Tivera  a coragem miserável de começar a fazer aquilo que sonho em vão.”
Passando a viver num barraco, dedicando-se totalmente a sua arte, Heinz tornou-se a vergonha do pai que mesmo alcoólatra mantinha seus pruridos burgueses e envergonhava-se  junto aos amigos quando se comentava sobre Heinz. “Assim ele, este bicho  absolutamente iníquo pelo qual todos deviam sentir vergonha, uma vergonha coletiva- social, pois  ele de uma forma ou de outra parecia mesmo perdido para o mundo, para os próprios sonhos, ao mesmo tempo um aborto vivo locomovendo-se num ambiente  ultra pessoal que criara de repente, rapidamente, de tormentos para os quais jamais haverá repouso, fim e nem sequer houve começo.”
Heinz  nas palavras do autor, passou assim após ultrapassada a tempestade dos vinte anos a “viver ancorado abruptamente na baia do desespero.”
Ricardo Hoffmann criou com  Heinz o personagem mais completo e apaixonante da literatura catarinense, esse jovem angustiado em busca da essência do seu ser e da arte que a expresse,  pode ser colocado ao lado   dos personagens de Herman  Hesse com sua procura radical  do auto conhecimento  e de um sentido mais profundo para  a existência.
Na literatura catarinense vamos encontrar  um paralelo com HEINZ  no Araldo, personagem inesquecível e pungente do EVOCAÇÕES,  prosa poética de  Cruz e Sousa. No poema denominado “Nirvanismos”   Araldo, ‘peixe fora d ‘água’ desajustado e sem lugar numa sociedade mercantilista prosaica e hipócrita, impossibilitado de conviver com seres  “de ventre cheio e cabeças vazias”, afasta-se do convívio humano adentrando cada vez mais   na escuridão das florestas, onde como animal solitário  por todos desprezado acaba  desintegrando-se, sumindo como miragem sem deixar rastros.
Heinz vai buscar na fria escuridão das águas barrentas do rio que atravessa a sua aldeia o mesmo refúgio  e a mesma paz que Araldo foi buscar nas  impenetráveis  florestas. Paz, acolhimento e aceitação que não encontraram  entre seus iguais. Representação simbólica das forças do inconsciente que ambos decidiram  ouvir, tanto o rio como a floresta tornaram possível para Heinz e   Araldo, embrenharem-se  cada vez mais profundamente  nos poços e emaranhados de suas forças intuitivas até desaparecerem por completo.
        A grandeza trágica de personagens  como HEINZ, que assumem intuitivamente  os riscos existenciais da entrega  aos seus sonhos em busca de sua liberdade, da superação dos limites impostos pelo cotidiano prosaico, medíocre e mesquinho proposto como padrão a todos  de forma cada vez mais inexorável, encontra nas páginas de “A SUPERFÍCIE” uma das suas abordagens mais impactantes, brilhantes e bem arquitetadas.
 A construção  do livro é exata em cada detalhe. No capitulo final  intitulado “No Terceiro Dia”, a atmosfera expressionista predominante em toda a narrativa chega ao paroxismo. Numa cena do capitulo anterior, Beto presenciara  a chegada de uma mendiga com transtornos mentais que chega ao estúdio de Heinz onde costumava dormir segurando seu saco de trapos. Essa cena digna de uma xilogravura de Goeldi, é um preâmbulo para o que está por vir. Nas páginas finais,  a  narrativa assume um ritmo frenético, quase cinematográfico, pela riqueza de imagens e detalhes intercalados com a ação dos personagens que dirigem-se para  as barrancas do rio onde se supõe que estaria o corpo de HEINZ desaparecido há três dias.
Com agilidade de câmara  e edição de um thriller de horror e suspense,  detalhes e cenas se superpõem-se  num clima de pesadelo. Numa  luz crepuscular que envolve os vultos dos personagens, movendo-se  entre a escuridão úmida da vegetação  e das barrancas ribeirinhas, as águas barrentas do rio refletem as  lanternas de querosene recém acesas nas barcaças que deslocam-se com varas e redes procurando em vão o suposto cadáver.  Os trilhos do trem que tem que ser atravessados para chegar ao rio, o movimento  dos vagões manobrando, o apito do trem que se aproxima, tudo se entrelaça numa atmosfera sinistra,  digna do desespero e medo que se desprende das páginas sombrias do romance “No Coração das Trevas” de Joseph Konrad.
Movendo-se neste clima  tétrico,  o chefete da estação de trem,  com seu boné encarnado  e os galões dourados de seu uniforme, querendo estender seus domínios até as margens do rio, ordena a seus subalternos que barrem  o aceso de curiosos que tentavam se aproximar do local para, segundo o chefe, “gozarem  com o espetáculo da dor alheia”. Nos vultos que movimentam os barcos está o próprio velho Holtz, pai de Heinz, de certa forma responsável pelo que aconteceu,  ou se supõe ter acontecido, com o filho que já nem via mais, envergonhado por sua decisão de viver  para pintar o que lhe desse na cabeça.
A certa altura das buscas, com a noite chegando o pai diz : “Ele não está aqui. Fugiu da cidade tenho certeza. É inútil continuar procurando no rio.” Ao que o chefe da estação responde,  falando o que todos  os presentes estavam achando: “-O senhor desejaria que ele ainda estivesse fugindo do senhor como vinha acontecendo, mas ele fugiu, refugiou-se definitivamente. Se fosse possível o senhor o seguiria até o inferno e estaria sempre seguro de suas razões, de sua justiça e de seu direito. É tarde demais para trazê-lo de volta. Nem o corpo o senhor encontrará, nem sequer o corpo.”
          No texto final, Beto dirige-se ao velho Holtz que   recorreu ao seu  depoimento tentando mitigar a sua culpa:  “-Ele vinha se desligando de todos nós há muito tempo, continuava ali com o corpo, mas isso não é tudo, qualquer pessoa sabe disso. Fugindo terá praticamente morrido. O senhor precisa compreender que não faz nenhuma diferença de antes. Há muito que ele estava se libertando de nossa grosseria gradativamente.”
Esse é o epílogo dessa obra magistral  que merece ser lida por todos. Tratando de questões vivenciais,  aborda a dor do existir com a mesma perplexidade e paixão de Clarice Lispector, refletindo sobre a criação artística, sobre o processo de construção da obra  de arte,  sobre o quanto isso exige do criador, contrapondo a liberdade, a criatividade, a poesia ao prosaico senso  pequeno  burguês,  que não está nem ai para as coisas do espírito, Ricardo Hoffmann  com um texto a altura dos grandes autores  da literatura mundial, criou uma obra de sentido universal,  que além da sua qualidade artística e literária, funciona como um dos mais contundentes libelos contra a alienação do ser em relação ao  sistema e  ao cerne de sua própria existência, cujo sentido só ele pode descobrir e cuja plenitude só ele pode realizar.





quinta-feira, 21 de junho de 2018

DESTERRO DESATERRO - ESTADO DE INVENÇÃO INVADE O MASC



   Intervenção de Fê Luz                                                                                                      Foto: Rodrigo Sambaqui

O público jovem que lotou as dependências do museu na abertura da mostra DESTERRO DESATERRO como há anos não se via, mostrou o acerto do direcionamento que o MASC   assumiu. Centenas de jovens das mais diversas áreas, como das artes visuais, da música, da dança, do teatro, da performance, da literatura, prestigiaram com sua presença esse importante ato cultural. Pensante, reflexivo, interessado, capaz de decodificar o significado das obras e interagir com as mesmas, esse tipo de público voltou a frequentar o MASC, pois percebeu que a partir do novo direcionamento dado, o museu reencontrou seu caminho passando a liderar o setor das artes visuais do Estado com uma programação coerente e qualificada.
DESATERRO começa no próprio saguão do CIC com uma instalação de Raquel Stolf, apropriando-se de uma cabine audiométrica utilizada para testes de audição, a artista induz o espectador a entrar e ouvir através de um fone de ouvido o som do seu batimento cardíaco. A vivência propiciada por esse momento de recolhimento num local isolado dos sons externos, com a atenção voltada unicamente para o próprio pulsar da vida em nosso corpo, é muito densa e reveladora. Trabalhando sempre com extrema sensibilidade e sutileza, Raquel pela densidade poética de suas intervenções é um dos nomes de maior destaque na cena contemporânea catarinense. Não poderia ser melhor a escolha de sua proposta para iniciar a mostra DESATERRO.

   Instalação Raquel Stolf                                                                                  Foto: Rodrigo Sambaqui

Para a arte de hoje interessa sobretudo o sentido, o conceito ou ideia de que a obra é portadora. Quanto mais vigorosos e autênticos esses conteúdos vivenciais, mais entusiasmo são capazes de suscitar.
É isso que explica o grande fluxo de público não só na abertura como também o que vem ocorrendo no decorrer da exposição.
Ao aproximarmo-nos da porta de entrada do museu outra surpresa: o Grupo Tropicalista formado pelos dois arquitetos e designers Marcelo e Jean transformou o anódino hall de entrada do MASC numa criativa e ecológica instalação que funciona como um espaço vivencial.

  Instalação Grupo Tropicalistas - detalhe                                                                           Foto: Rodrigo Sambaqui

Logo na entrada das salas de exposição, num texto de parede que apresenta a mostra, Josué Matos assina um contundente manifesto posicionando-se corajosamente sobre a atual situação do museu, apontando para o que pode e deve ser feito para que o MASC tenha reconhecida sua importância e possa cumprir plenamente o papel que lhe cabe na sociedade catarinense.

    Instalação Grupo Tropicalistas - detalhe                                                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

Um vídeo de Tirotti apresentando imagens de um peixe nadando de um lado para o outro dá inicio a sequência das obras expostas, que passeiam pelos mais diversos caminhos disponíveis aos artistas de nossos dias, propondo sempre a busca reflexiva através da imagem plástica. Uma surpresa é a presença significativa de obras ainda possuidoras de materialidade, como é o caso dos diversos artistas que recorreram ao desenho, a pintura, a assemblages, a escultura ou até mesmo a cerâmica e a porcelana.
Imprimindo uma nova dinâmica ao espaço expositivo, tornando-o um local não somente para contemplação e fruição estética, mas, sobretudo para reflexão questionamento e conscientização, a visão curatorial da mostra DESTERRO DESATERRO, na fluidez de sua montagem, permite que o público circule livremente por entre o número considerável de obras expostas criando seus próprios roteiros, estabelecendo suas próprias conclusões a respeito das consonâncias ou confrontos entre uma proposta e outra. DESATERRO propõe o exercício experimental da liberdade, estratégia adotada pelos artistas como forma de não se deixarem manipular nem se atrelarem aos valores do sistema.

   Intervenção - Fê Luz - detalhe                                                                                    Foto: Rodrigo Sambaqui

Espalhadas por todo o espaço do museu pequenas plaquetas de madeira com indicações e textos tipo “SEU SISTEMA ESTA EM RISCO” constituem a proposta de Fe Luz, uma artista que vem se notabilizando pela inserção destes dizeres no espaço urbano provocando o olhar a reflexão e a atenção do passante.

   Watcher - Diego de los Campos                                                                                      Foto: Rodrigo Sambaqui

Diego de los Campos montou “WATCHER“, uma estrutura com sensores, que quando alguém se aproxima movimenta os olhos e as três cabeças construídas com papel kraft colocadas em forma de tridente uma ao lado da outra. O olhar perdido destes personagens nos observa com a mesma melancolia do peixe que no aquário de Tirotti nada de um lado para o outro sem conseguir sair do lugar onde se encontra aprisionado.

    Pintura - Diego de los Campos                                                                                    Foto: Rodrigo Sambaqui

Diego além dessa montagem participa com uma inquietante pintura de uma vaca composta por duas metades do corpo acopladas sem as cabeças compondo um enigma surreal.

   Instalação - Juliano Jahn. Ao fundo 'Imperatriz Antropófaga - Lindote                            Foto: Rodrigo Sambaqui

A esquerda de quem entra no MASC, na parede de fundo vê-se a imponente “IMPERATRIZ ANTROPÓFAGA” de Lindote, representando através da figura mítica da escrava Anastácia, o sofrimento e o genocídio a que foram (e continuam sendo) submetidos, os povos que construíram esse país escravocrata durante  os séculos da sua formação.
Coroada simbolicamente com um exuberante buque de orquídeas tropicais “IMPERATRIZ ANTROPÓFAGA” pontifica dentre os DESATERRADOS com sua convincente riqueza técnica e conceitual.

      'Imperatriz Antropófaga' - Lindote                                                          Foto: Rodrigo Sambaqui

Na parede ao lado  situa-se o “Vale das estranhezas” de Cyntia  Werner, obra que consta de uma série de desenhos realistas representando os corpos nus de mulheres  e homens de diferentes idades e raças  marginalizados pelo sistema.

   'Vale das estranhezas' - desenh - Cyntia Werner                                                             Foto: Rodrigo Sambaqui

Defronte a pintura de Lindote instalou-se a proposta de Juliano Jahn que consta de um conjunto de bússolas colocadas sobre cubos negros. Movimentando-se sem parar e apontando para diferentes pontos, confundem nossa percepção espaço temporal subtraindo por instantes nosso NORTE. Juliano  encontrou uma maneira bem singular de colocar seus questionamentos. Focando já há algum tempo as forças magnéticas como mote de seu trabalho, parece-nos que a Land Art seria um campo onde ele poderia ampliar e expandir  suas possibilidades.

   Foto sobre metalatex - Karina Zen                                                                                   Foto: Rodrigo Sambaqui

Numa outra parede “Unidade composta” de Karina Zen  propõe a poesia visual de um painel formatado pela justaposição de detalhes de fotos de nuvens, mar e ilha sobre superfície de metalatex.

   Técnica mista - Juliana Hoffmann                                                                                    Foto: Rodrigo Sambaqui

Juliana Hoffmann tendo como suporte placas de vidro marteladas superpõe imagens da natureza sobre superfícies fragmentadas transparentes, criando efeitos visuais bastante interessantes. A partir da quebra acidental de um vidro, Juliana soube aproveitar o acaso e partiu ela mesma para martelar o suporte, até conseguir a trama de ranhuras que dão um novo aporte às imagens que a artista sobrepõe ao vidro. Esse dialogo com o material, essa percepção de novas possibilidades expressivas que se abrem a cada passo, são fundamentais para o artista ir desbravando cada vez mais caminhos desconhecidos, ampliando seu repertório e não limitando-se a ficar simplesmente repetindo para sempre fórmulas que deram certo.

                   Técnica mista - Paulo Gaiad                                        Foto: Rodrigo Sambaqui

Paulo Gaiad reúniu diversos materiais criando uma obra intitulada “SARA-INTOLERANCIA”, que aponta para a questão do ser fragilizado exposto a exclusão, preconceito e injustiça social.

   Objeto - Walmor Correa                                                                                 Foto: Rodrigo Sambaqui

Walmor Correa mostra um relógio cuco onde o pássaro que assinala as horas é um esqueleto que assombra com sua presença a passagem do tempo.
Diego Rayck mais conhecido por suas interferências gráficas na própria arquitetura, optou por homenagear os setenta anos do MASC fazendo uma releitura de duas obras do acervo, sendo uma de autoria de Iberê Camargo. Trata-se de um trabalho de proporções diminutas, mas que chama a atenção pela sensibilidade e precisão do traço.
Organizando suas poéticas através da busca do desconhecido, a maioria dos participantes dessa mostra elaborou propostas diversificadas, criativas, as vezes recorrendo ao humor, outras a vertentes poéticas, como é o caso da proposta “Arcano Dez” de Luciana Knabe ou de “Linha branca sobre simulação de mar” de Ian Campigoto e “Marcar o dia com pedra branca e preta” de Claudia Zimer. Sempre instigantes e desalienadoras, as obras que compõe DESATERRO vão sucedendo-se nos espaços do MASC levando o espectador de uma surpresa a outra.

   Técnica mista - Ian Campigoto                                                                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

Há uma preocupação ecológica evidente em muitos trabalhos, noutros um viés político ou um explícito teor ideológico pretende através da arte mobilizar o espectador para uma ação política mais atuante e crítica perante o que está por ai.

                   Instalação - Daniele Zacarão                                                                      foto: Janga

“Escute o rio Criciúma” de Daniele Zacarão, inspirada talvez no ‘Escute o Rio” de Cildo Meireles, é um trabalho singelo que consiste numa placa amarela colocada no chão fazendo com que o espectador tenha que se agachar para ouvir o som do rio emitido por um gravador. Seu significado  é bem pertinente: é necessário parar de destruir o meio ambiente, é necessário parar para ouvir, observar, perceber o que esta acontecendo, abandonar o comodismo e despertar para a realidade que nos cerca. Os rios estão morrendo e não fazemos nada, permanecemos passivamente de braços cruzados. Uma ironia: o rio Criciúma praticamente nem mais existe, seu leito foi totalmente canalizado e corre invisível por dutos subterrâneos no espaço urbano, como acontece com tantos outros rios destruídos por uma urbanização burra e predatória que não leva em conta nem mesmo a escassez planetária da água sem a qual a vida não é possível no planeta.

   Iftah Pelled                                                                                              Foto: Rodrigo Sambaqui

IFTAH PELLED em seu trabalho reuniu diversos cubos transparentes com a lama que destruiu a natureza na região de Mariana MG, num dos maiores desastres ecológicos jamais vistos.

   Foto e instalação - Janor Vasconcelos                                                                             Foto: Rodrigo Sambaqui

Janor Vasconcelos ao lado de suas expressionistas cabeças de cerâmica expõe duas fotos onde aparece a água dos rios de Siderópolis, região mineira de Santa Catarina, totalmente poluída pela indústria de extração do carvão, que aos poucos vai dando um aspecto apocalíptico a paisagem catarinense dos sul.

   Instalação 'Ouvir nas conchas o ruído do mar' Juliana Crispe                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

Em meio a tanta tragédia ecológica Juliana Crispe nos faz um convite poético para ”Ouvir nas conchas o ruído do mar”, bela proposta que posiciona ao lado de um espelho oval com uma figura desfocada no centro, dois caramujos situados um a cada lado do espelho. A artista nos propõe uma vivencia sensorial singela, mas plena de significados, que de certa forma homenageia as experimentações sensoriais de Lygia Clark. Juliana vem se destacando não só como artista, mas como curadora e animadora cultural, foi ela a principal responsável pela excelente coletiva do ARMAZEM 16 montada recentemente no CIC, mostra que impressionou pela qualidade e consistência.

   Video-Instalação - Yara Guasque                                                                                     Foto: Rodrigo Sambaqui

Outra proposta interessante, com múltiplos significados, é o trabalho de Yara Guasque resultante de sua pesquisa sobre a obra de Fritz Müller. A partir desse tema Yara montou uma individual no ano passado no museu Victor Meirelles, sem dúvida uma das mostras mais marcantes apresentadas no período. Intercalando recursos da vídeo arte a plantas e objetos, posicionou um monitor com imagens de plantas coletadas por Fritz Müller montadas sobre cartão pertencentes ao acervo do Royal College, na frente da tela Yara colocou ramos de macela e outras plantas secas da flora catarinense. Para quem não sabe, Fritz Müller foi um importante pesquisador da nossa flora, tendo inclusive colaborado com DARWIN de quem era amigo e com o qual manteve farta correspondência.
Pela dimensão da mostra seria fastidioso comentar o trabalho de cada participante assim optamos apenas por destacar algumas obras que nos chamaram mais a atenção numa primeira vista.


                   Video-instalação - Evandro Machado                     Foto: Rodrigo Sambaqui
                                                                                        Video: Luiza Lorenz

Muito bem realizada a instalação de parede “Continente Antropométrico” de Evandro Machado que une num mesmo painel desenho e vídeo arte numa perfeita interação entre um meio e outro. Vale a pena conferir as linhas do desenho a nanquim dialogando com as requintadas formas gráficas que se entrelaçam se contraem e se expandem no monitor que ocupa o ponto central da montagem.



   Instalação - Sergio Adriano                                   Foto da instalação: Rodrigo Sambaqui. Detalhe: Luiza Lorenz

Chamam a atenção também os objetos infláveis de Sergio Adriano com as palavras TU MATA EU, balões dourados recortam-se sobre a parede sobre a qual em formato de molduras foram carimbadas palavras como: preta, puta, viado, etc.
Há de tudo no DESATERRO, propostas de diversos teores e com diferentes propósitos se sucedem no espaço expositivo do MASC poucas vezes tão diversificado.

    Roberta Tassinari                                                                                                            Foto: Rodrigo Sambaqui

Não passam despercebidas, mesmo em meio a tal profusão  de obras dos mais diversos formatos, as discretas placas cimenticias de Roberta Tassinari, que propondo sempre um exercício de sensibilidade, expande nossa percepção sobre a natureza e possibilidades poético expressivas de materiais aparentemente inertes e sem vida.

   Instalação 'Nossa Senhora dos Homens' - Mauricio Magagni                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

Um espaço de sacralidade foi construído por Mauricio Magagni com sua instalação ”Nossa Senhora dos Homens“, que consiste num tipo de tenda de tecido branco penetrável, onde o espectador pode entrar e sentir-se protegido pelo grande manto que se abre e acolhe.

   Instalação - Mauricio Magagni - detalhe                                                            Foto: Rodrigo Sambaqui

Flávia Duzzo utilizando bastão grafite sobre papel justapôs traços criando tensas superfícies gráficas de grande força.  

   Fotografia - Giba Duarte                                                                               Foto: Rodrigo Sambaqui   
Giba Duarte marca presença na coletiva com uma grande foto em que destaca a forma de um cavalo em primeiro plano com sua cor neutra recortando-se contra planos de cor de intensos amarelos e verdes de uma capela  de madeira do interior, há algo de metafísico nessa atmosfera, sem dúvida um belo e impactante trabalho.

    'Dois Corpos' - pintura - Roberto Freitas                                                           Foto: Rodrigo Sambaqui

Já o conjunto de pequenas pinturas e um objeto apresentado por Roberto Freitas, pela maneira como conseguiu focar a fragilidade da condição humana, constitue-se na participação mais pungente do DESATERRO. Sua proposta intitulada ”DOIS CORPOS“, expressa seu impasse perante a morte e a perda do ser amado. Com sutileza incrível Roberto fala da separação dos corpos, da dor, da complementação entre os espíritos, da flutuação e da levitação do SER. Em seu objeto escultórico utiliza dois pequenos cubos de madeira posicionados um ao lado do outro, sendo que um deles flutua suspenso por um imã ao mesmo tempo em que desenvolve um movimento de rotação sobre si mesmo. Tratando com uma sensibilidade inigualável a questão vida-morte, espirito-matéria, permanência-transcendência, aborda uma das questões existenciais mais angustiantes que o ser humano enfrenta. Roberto atravessou sua própria dor criando uma pequena obra antológica com o seu inefável “DOIS CORPOS”.

                     'Dois Corpos' - objeto - Roberto Freitas                    video: Luiza Lorenz

Fernando Weber com seus registros diários onde une fotos e textos, assinala num deles: ”As ruinas são caveiras dispersas pela cidade”.
Vários outros artistas poderiam ser mencionados, Julia Amaral com sua série  meninas-elefante  que consiste em alguns desenhos e um grande elefante  inflável. Fabiana Weilewicki com seu vídeo instigante, Aline Dias com sua coluna de pastas de arquivo e suas fileiras de traças coladas nas paredes, Lela Martorano com suas imagens provenientes de fotos de álbuns de família impressas sobre papel de out-door, Bianca Tomazelli e sua interferência quase imperceptível a um olhar mais apressado, Gabriela Machado com suas pinturas seu desenho e sua surpreendente peça de porcelana cromada, enfim tantos nomes mais com propostas igualmente interessantes poderiam ser mencionados, porém esse artigo ficaria excessivamente longo.

   Objeto em porcelana policromada - Gabriela Machado                                                   Foto: Rodrigo Sambaqui

O que fica bem claro para quem visita a mostra com atenção é que assim é o artista de hoje: trabalha com e sobre o observador, estimulando sua consciência, sua percepção sensorial, provocando um despertar ou elevação do seu nível de apreciação do fato plástico e da realidade total, cumprindo assim um dos objetivos mais nobres e vitais da arte. É isso que os artistas que participam do DESATERRO propõem, utilizando-se dos meios tecnológicos e dos recursos de sua época. Esse é um dos fatores que torna essa mostra tão interessante, fazendo com que desperte tanto interesse e seja tão visitada.
As pessoas saem dali mais ricas, mais sensíveis, mais despertas, não é só portanto uma questão de achar feio ou bonito, gostar ou não gostar.
Conceito, sentido e ideia são os pressupostos básicos sobre os quais trabalha o artista lucido de hoje e é isso que está posto, não se trata de uma mostra definitiva em termos históricos sobre o percurso percorrido pela arte contemporânea em Santa Catarina pois muitos nomes fundamentais e incontornáveis ficaram de fora, Mas não se trata disso, algo assim exigiria muito mais tempo e uma pesquisa mais profunda para chegar a um levantamento completo.
DESATERRO mostra como a arte contemporânea catarinense evoluiu. Há trinta anos atrás com muito custo chegava-se a utilizar todos os dedos das duas mãos para contar quem poderia participar com merecimento de uma mostra contemporânea, hoje felizmente a situação finalmente mudou. Mesmo com um número relativamente grande de participantes, DESATERRO deixou muita proposta boa de fora, na verdade se quiséssemos fazer uma revisão completa de quem é quem na arte contemporânea catarinense, o MASC seria pequeno para expor todos.
DESTERRO DESATERRO funciona como um panorama da produção atual com algumas referências históricas. Cumpriu bem seu papel de mostrar o patamar de excelência alcançado pela arte catarinense nestas últimas décadas. Atualizada, alinhada com o que vem se fazendo de melhor na produção nacional contemporânea, a arte catarinense da atualidade conta hoje com vários nomes de projeção nacional, está inserida pela primeira vez na história no circuito nacional das artes visuais. Muito mais pode ser feito, mas ai já é outro assunto, por ora cumprimentos a todos que participaram e aos seus idealizadores.

   Instação - Aline Dias                                                                                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

De maneira geral Desaterro retirou a obra do seu pedestal colocando-a no contexto cotidiano sem mistificações nem tapetes vermelhos. Essa proposta de socializar a arte e entrega-la ao poder efetivo do público converte a obra em proposta onde o processo conta mais que o resultado final, o caráter processual de boa parte das obras selecionadas deixa claro outra atitude, outra postura outro aporte. A dimensão simbólica inovadora das obras selecionadas estabelece um dialogo franco com o público, um dialogo interativo onde o outro tem sua identidade respeitada atuando, influindo e encerrando o circuito criativo.
Negando-se a ser o criador de bibelôs de luxo, decorador de palácios ou mansões suntuosas, bobo da corte e beija-mão dos poderosos, os artistas contemporâneos assumem as contradições do seu tempo tornando-se protagonistas de um processo que permite vislumbrar um mundo menos vertical, menos injusto e desigual, mais humano mais horizontal e compartilhado.
Se conseguirão ou não contribuir para as coisas mudarem, a história dirá, por ora já é gratificante perceber que, ao menos para as novas gerações, o interesse pelo social parece ter suplantado interesses mercantilistas e individualista típicos dos narcisos endeusados pelo sistema ao qual prestam vassalagem.
Esses artistas contemporâneos comprometidos com os desafios de sua época antecipam o surgimento de uma sociedade sem mais diferenças entre um e outro, onde o trabalho não seja mais uma atividade escravocrata e alienante, uma sociedade que encare o lazer não como uma ausência ociosa do trabalho, mas sim como o exercício pleno da criatividade e da liberdade.
A Arte Contemporânea lida com o que se passa no presente de forma como não o faz qualquer outro meio de arte, é ela também o único campo que coloca como matéria-prima o diálogo com outras linguagens como literatura, dança, áudio–visual, musica e outras formas de conhecimento, o artista de nossos dias mais que preocupar-se com o resultado final do bem feito, do bem acabado, propõe gestos, ações coletivas, movimentos no plano da atividade criadora.
Como da para perceber nas obras dos diversos artistas que compõem DESATERRO, a resposta ao que nos preocupa, cerca, aflige, é imediata e recorre aos mais diversificados e inusitados suportes. Para comunicarem–se utilizam os meios mais diversos tais como pintura, fotografia, escultura, vídeo, desenho, arte têxtil, objeto, instalação, cerâmica, colagens, assemblages, apropriações, etc. Inter-relacionando estes materiais com a mais absoluta liberdade.

   Traplev                                                                                                                              Foto: Rodrigo Sambaqui

TRAPLEV por exemplo colocou em pontos estratégicos do espaço da mostra faixas de pano com textos que questionam o sistema.
Não se trata de militância política simplesmente, mas sim de um posicionamento ideológico expresso de forma visualmente impactante que entre outras coisas desafia a sacralidade conferida aos espaços museológicos. Funciona como uma provocação, um impulso para despertar, sair do sono, acordar para a existência, perceber o que está acontecendo no mundo ao nosso lado e conosco mesmo.

   Traplev                                                                                                                                        foto: Luiza Lorenz

A sociedade de consumo se impôs de maneira tal pela comunicação de massa que deu a imagem uma força atributiva maior que a palavra, fornecendo ao poder da publicidade suas invencíveis e letais armas ofensivas.

   Proposta - 'the imbecil'                                                                                                     Foto: Rodrigo Sambaqui

A arte contemporânea é um dos únicos lugares onde pode ser confrontada essa verdadeira lavagem cerebral que os meios de comunicação vomitam o tempo todo. Mais que nunca a arte permanece como reduto inexpugnável, onde o exercício da reflexão, do questionamento, da criatividade e da liberdade pode ser exercitado.  
A trava conservadora das nossas arcaicas instituições políticas não tem a menor possibilidade de entender o que está acontecendo no seio da sociedade ou na periferia das grandes metrópoles. As contradições se exacerbam, a revolta espraia-se por todos os lados sem que nada possa ser feito, pois nem sequer se sabe em nome de que ética, de que princípios, de que moral esses protestos existem e acontecem. Vivemos numa sociedade sitiada por suas próprias contradições e impasses, urge pensar e repensar tudo, propor ações novas, novas maneiras de atuar na sociedade, de conviver, de exercer a cidadania, de participar da transformação inadiável. Mais que simples opção ético-estética é uma questão de sobrevivência da própria espécie humana e das demais espécies ainda vivas, da sobrevivência do próprio planeta. Evidentemente que é incomodo abordar esses assuntos, toma-los como motivações da própria obra, isso incomoda, causa desconforto, provoca movimentos em direção a mudanças, e isso é tudo que o sistema não quer. O artista genuíno é aquele que aceita e encara os desafios do seu tempo custe o que custar. E a arte contemporânea é o único espaço que permite isso com seu exercício experimental da liberdade.

ARTE É TRANSFORMAÇÃO!


 

    Instalação - Claudia Zimer                                                                                                         Foto: Rodrigo Sambaqui

                     Juliana Crispe                                                                                  Foto:Janga
    Instalação - Doraci Girrulat                                                                                                            Foto: Rodrigo Sambaqui
                     Objeto textil - Berenice Gorini                                                                                  Foto: Rodrigo Sambaqui

    Pintura - Rodrigo Cunha                                                                                                             Foto: Rodrigo Sambaqui

                     Detalhe de instalção fotografica                                                                 Foto: Luiza Lorenz

                      Objeto - Clara Fernandes                                                                 Foto: Rodrigo Sambaqui

                                 "Arcano Dez" - Luciana Knabe                                video: Luiza Lorenz