domingo, 30 de abril de 2017

27 de Abril de 2017/Reunião Histórica - O Renascimento do MASC



O pronunciamento do administrador e curador do MASC Josué Mattos, no encontro  histórico do dia 27 de abril  de 2017,  inicia toda uma nova etapa para a arte catarinense,  que passa a contar com uma liderança de indiscutível capacitação para fazer  com que o principal museu de arte de Santa Catarina desempenhe plenamente suas funções.
Uma série de fatores uniram-se e agora, felizmente, as coisas tomaram outro rumo e  parecem que vão mesmo  mudar.  O resultado mais imediato dessa mudança já pode ser sentido na maneira como a FCC  se fez presente com toda sua equipe gestora na reunião convocada pela nova direção do MASC,  que reuniu artistas, críticos, jornalistas e intelectuais praticamente lotando a plateia do cinema do CIC para discutir pela primeira vez  em público o destino e  o papel do nosso principal museu de arte.
Com pronunciamentos claros, objetivos,  sem as desculpas e os nhem-nhem-nhem de sempre, a nova direção da FCC soube admitir os erros que provocaram as recentes polêmicas envolvendo os destinos do MASC, comprometendo-se a superá-los.  Na oportunidade desse encontro, prestigiado pela presença de toda a equipe da FCC, ao dialogar com o público presente, Josué Mattos mostrou que não é apenas um curador de reconhecida competência, mas um gestor que sabe pensar os caminhos a serem trilhados para atingir os objetivos a que se propõe como administrador.
Dentre  os diversos tópicos abordados em seu pronunciamento, merece destaque a ênfase que deu ao fato de que o MASC foi criado não por iniciativa do poder público mas sim por toda uma geração de artistas comprometidos com a modernidade que não mediu esforços para deflagrar um processo de atualização da arte catarinense  até então  parada no tempo e no espaço. ASSIM, CONFORME  AFIRMAMOS EM TEXTOS  DESTE BLOG, JOSUÉ REAFIRMOU EM SUA FALA QUE O MASC PERTENCE AOS ARTISTAS CATARINENSES E AO PÚBLICO QUE O PRESTIGIA!  Ao poder público, que depois  oficializou a criação do museu de arte encampando a ideia do grupo de artistas considerados meio malucos na época, cabe respeitar  essa vocação de origem, jamais repetindo  o que fizeram recentemente, entregando-o  a leigos, como se tratasse de  apenas mais uma repartiçãozinha qualquer. Cabe aos artistas e as suas associações de classes   ficarem atentos, não permitindo que essa insensatez e desrespeito se repitam  jamais na nossa história.
Mas voltemos  ao período de criação do MAMF (Museu de Arte Moderna de Florianópolis)  pelos jovens do Grupo Sul,  embora como o próprio Josué citou, o modernismo tardio que chegava a Santa Catarina no final dos anos quarenta já tivesse uma defasagem de origem em relação as vanguardas internacionais, em termos de Brasil a semana de arte moderna representou não obstante  isso, um avanço incomensurável em relação ao tipo de arte que se praticava no país, e de certa forma criou uma maneira peculiar de pensar, revelando sua própria versão de modernidade.  Ao chegar a Santa Catarina, essa preocupação inicial do modernismo com a questão da identidade nacional, acabou estimulando alguns  integrantes do GAPF (Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis)  a buscarem nos temas regionais uma suposta identidade catarinense.
De início, rejeitados pelo  público e pela sociedade local  (um colunista social da época chegou a jogar milho no espaço de uma exposição do GAPF para ridicularizar os galos do genial Meyer Filho), os artistas plásticos surgidos a partir do Grupo Sul, da mesma forma com que seus colegas escritores tiveram que enfrentar as paliçadas dos parnasianos que se abrigavam na Academia  Catarinense de Letras, tiveram, por sua vez, que desafiar e enfrentar o anacronismo dos cânones acadêmicos vigentes na sociedade local.  Aos poucos, o público foi se acostumando, entendendo e aplaudindo. Criou-se então uma nova tradição de figuração lírica modernista regional que a crítica paranaense  Adalice Araújo com sua tese de doutorado nos anos setenta, vai intitular de mito-mágica. Nessa tese  brilhante, Adalice fala sobre a existência de um espaço catarinense cujas peculiaridades refletiam-se nas obras de  nossos artistas mais representativos da época.
Até ai tudo bem, mas considerando que estávamos em plena vigência da pós-modernidade, as questões  a serem encaradas já eram outras bem diversas daquelas propostas pelo Grupo Sul nos anos quarenta. Fiz parte, juntamente com Max Moura, Jayro Schimidt e outros da primeira geração pós-moderna catarinense que surgia no período do final dos anos sessenta. A história repetiu-se, fomos hostilizados, tachados de malucos e até proibidos de participar dos vernissages do MAMF. Eu e Max  inclusive fomos impedidos de expor na única galeria da cidade que pertencia a radio Diário da Manhã. A exposição minha e do Max que já tinha ido residir em São Paulo, só ocorreu pela intervenção de Carlos Humberto Correia que nos cedeu o hall do TAC para que a mostra pudesse acontecer.
Como estávamos propondo uma linguagem nova para os parâmetros locais vigentes, provocamos ira e indignação que o tempo transformou em reconhecimento.
Quanto mais provinciano é um ambiente, mais ele resiste ao  novo e ao que vem de fora, talvez por um medo inconsciente de perder sua própria identidade.
Atualmente, ao menos a capital do Estado mudou, tornou-se mais cosmopolita, mais informada, menos fechada sobre si mesma. Mas ainda existem grandes focos de reação e de resistência ao que vem de fora. Prova disso é a desconfiança de alguns quanto às intenções do novo curador do MASC.  Apesar de os planos que Josué Mattos já traçou nesse pouco tempo, expostos  com objetividade e clareza no encontro do dia 27, demonstrarem claramente  o compromisso com  a valorização da arte catarinense e a compreensão de suas especificidades regionais e históricas, ainda tem gente  duvidando do acerto de suas propostas. O tempo esclarecerá essas  dúvidas.
 Já abordando outra questão e respondendo a pergunta de uma jornalista sobre a necessidade urgente de criação de um conselho consultivo, ele foi bem feliz  ao questionar em sua resposta a forma como editais são analisados as pressas por comissões que tem no máximo três dias (por vezes apenas uma tarde) para  analisar e julgar as centenas de  propostas dos concorrentes a cada edital.
 Falou também da necessidade de serem criadas outras formas de participação que evitem os constrangimentos de artistas com décadas de percurso terem que se submeter aos apressados pareceres das famigeradas comissões seletivas,   bem como de substituir essas apressadas avaliações por uma equipe de pesquisadores que sem pressa e com profundidade possam proceder  a uma pesquisa de trajetórias, percursos, poéticas e criação de linguagens por parte dos  artistas propositores.
Uma vez validada a proposta, seria dada carta branca e uma ajuda de custo ao propositor para executá-la . Essa forma mais adequada já colocada em prática   por varias instituições funciona muito melhor que esses sistemas  puramente burocráticos que obrigam os artistas a preencherem  um monte de fichas, pagar taxas e a taxas para no final das contas terem seus  trabalhos  avaliados  em questão de minutos por quem em geral desconhece totalmente sua trajetória.
Quando se trata de arte contemporânea, não é mais possível utilizar os mesmos critérios que   se utilizava para analisar por exemplo a qualidade de uma escultura, pintura ou desenho. Uma obra aberta precisa ser avaliada em todo seu processo de criação, sua poética, é necessário  avaliar a coerência  e relevância das questões propostas, adequação da linguagem utilizada  e muitos outros  aspectos que exigem sobretudo  pesquisa e tempo para serem analisados. O conselho consultivo  de um museu é importante para auxiliar nesse processo, para propor estratégias e dialogar com o curador  mas nunca para engessar  ou burocratizar suas decisões.
Conversando com alguns artistas, percebi uma preocupação com a possibilidade de que a nova direção do MASC privilegie  apenas artistas do eixo Rio-São Paulo deixando a arte catarinense em segundo plano. Pelo que ouvimos  nesse primeiro encontro com os artistas, essa preocupação parece-nos  infundada e improcedente. Josué Matos possui uma consciência bem clara da sua responsabilidade como mentor intelectual do principal museu de arte de Santa Catarina e temos certeza  que saberá desempenhar sua novas funções com o mesmo brilho com que vem exercendo seu papel de curador, que já lhe conquistou o reconhecimento   nacional. Isso ficou bem claro na decisão de iniciar a programação de sua gestão mostrando nas próprias salas do MASC a coletiva de  jovens artistas que através dela protestaram contra a não continuidade do Salão Nacional Victor Meirelles, que bem ou mal era uma da poucas oportunidades para nossos artistas e público terem um contato direto com a produção contemporânea nacional, ao mesmo tempo que dava visibilidade para a arte catarinense da atualidade. Caracterizada pela experimentação e pesquisa, essa exposição organizada pelo Coletivo NaCasa, faz com que o MASC retome seu  papel  fundamental de tornar-se um espaço que estimule a reflexão, o questionamento e o debate permanente sobre questões básicas da contemporaneidade.
Como bem ressaltou Josué em seu histórico pronunciamento, não tem cabimento o MASC restringir-se a prosaica missão de pendurar ‘quadrinhos na parede’ para vender para os decoradores de plantão.
Uma das próximas  mostras que o MASC  trará para o vão central do museu (claraboia) será um specific-site do artista florianopolitano Roberto Freitas. Roberto formado na UDESC vem destacando-se por suas instalações sonoras que ampliam o campo de nossas percepções através da utilização dos sons.
 A análise consistente, o olhar inteligente  e sensível sobre a produção contemporânea que  tem caracterizado a atuação profissional de Josué Mattos enriquece sobremaneira  o MASC, ampliando consideravelmente as possibilidades e o alcance de sua atuação. Era justamente isso que  faltava e o  principal motivo pelo qual tanto lutamos.  O MASC portanto está em boas mãos e os artistas catarinenses não tem com o que se preocupar.  Trata-se agora  de cada um colaborar com seu interesse e participação para que esse processo de  renovação atinja  o Estado como um todo!
Graças aos céus, dessa vez os deuses foram generosos com Santa Catarina!!!

 MAKTUB.


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